O povo açoriano está, nestas dias que antecedem a festa de Pentecostes, voltado para ao Santuário da Esperança, na ilha de São Miguel.
Está a decorrer o novenário preparatório para as grandiosas solenidades em honra de Santo Cristo dos Milagres que, naquela ilha se vem, ininterruptamente, celebrando desde o século XVI, quando o Papa Paulo III ofereceu a duas religiosas micaelenses, a santa imagem, segundo relata o Pe. José Clemente.
A grande devota de Santo Cristo foi a Venerável Teresa da Anunciada que, segundo o seu biógrafo, tinha colóquios íntimos com o Seu Rei e Senhor.
Não se conseguiu ainda que a Igreja Romana elevasse às honras dos Altares a Venerável Religiosa. Todavia, Ponta Delgada já prestou condigna homenagem à Venerável Madre Teresa da Anunciada, colocando a sua estátua junto do convento onde ela passou os últimos anos de vida.
Bem merecia que algo mais se promovesse em ordem à finalização do processo de Beatificação.
E isso em nada desmerece ou diminui o culto ao Senhor Santo Cristo, presente no convento da Esperança e, igualmente, em diversas igrejas das ilhas açorianas e até na Diáspora.
A ilha do Pico, além do culto normal a Jesus Cristo, - e ele é bem patente na veneração das Imagens do Bom Jesus de São Mateus, Calheta e Criação Velha, na paróquia da Silveira é o Senhor Santo Cristo, como nas do Senhor Jesus Crucificado de Santa Cruz das Ribeiras ou do Senhor Jesus das Preces, venerada na Matriz das Lajes - tem um culto especial à segunda Pessoa da Santíssima Trindade, em todas as igrejas paroquiais.
A Ilha do Faial festeja, oficialmente, em cumprimento de um voto muito antigo, o Santo Cristo da Praia do Almoxarife. São Jorge presta culto ao Santo Cristo da Caldeira. A Terceira venera na capela da Natividade de Angra, o Santo Cristo da Terceira.
Por toda a parte é o povo em prece ante as Imagens Venerandas, quer em corpo inteiro, quer em busto, ou no Senhor Crucificado, muito embora algumas imagens mereçam mais atenção dos fiéis, como é o caso do Santo Cristo do convento da Esperança, ou do Bom Jesus da paróquia de S. Mateus do Pico, ambos os templos declarados santuários pelo Prelado da Diocese.
Mas maior e mais vincado é o culto ao Senhor Santo Cristo dos Milagres de Ponta Delgada que ali atrai durante o novenário e festa, milhares de devotos, muitos idos das ilhas açorianas e numerosos vindos das terras da Diáspora, onde se encontram milhares de açorianos imigrados.
Quem um dia tomou parte nas festas e, principalmente, na Procissão, não ficou indiferente ante a fé dos devotos e dos sacrifícios que centenas deles fazem no cumprimento de promessas feitas em horas de angústias e dores.
A festa de Santo Cristo mantém o secular programa. A procissão segue, anualmente, o mesmo percurso de há séculos e não haja quem pretenda modificar o itinerário porque os micaelenses não consentem. E ainda bem que é assim. É um acto litúrgico e a liturgia não anda ao sabor dos modernismos mas mantém os seus princípios de culto a Deus e aos Seus Santos. E o Santo Cristo é, na realidade, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade: Um só Deus em três Pessoas iguais e distintas ensina o antigo catecismo. E o Concílio de Trento já declarara: “O Pai aquilo mesmo que o Filho, o Filho aquilo mesmo que o Pai, o Pai e o Filho, aquilo mesmo que o Espírito Santo, ou seja um único Deus por natureza”.
Não vim dar uma lição de catequese. Não me compete. Venho lembrar a festa da Segunda Pessoa da SS. Trindade – o Filho, que veio ao mundo, encarnou e se fez homem e sofreu e morreu pelos outros homens seus irmãos. E é uma passagem da Sua Vida – Cristo apresentado no Pretório de Pilatos à turba enraivecida, que hoje veneramos na sua bela e expressiva Imagem do Ecce Homo. Imagem milagrosa. Imagem que recorda aos homens um dos momentos mais angustiosos de Cristo ao sofrer a Paixão e Morte na Cruz. E são todos esses passos da Paixão que o povo crente recorda com fé, recolhimento e gratidão, implorando a seu jeito os favores de que necessita, quer materiais quer espirituais.
É por isso que milhares e milhares de devotos caminham descalços ou de joelhos sobre as calçadas, onde deixam algum dos seu sangue de mistura com dores físicas, a expiar as dores morais porque passaram em momentos de aflição e dor.
Não se pode assistir a estes actos de verdadeira penitência sem uma reflexão íntima de pena e angústia a compartilhar sofrimento com os irmãos que sofrem.
Como Mons. Pereira da Silva terminava as suas palestras no Rádio Clube de Angra, a assinalar o lº centenário da festa do Bom Jesus, de São Mateus do Pico, em Agosto de 1962, assim finalizo este modesto escrito: Senhor Jesus, não olheis para a minha indignidade e faze-me um dos teus romeiros. Mete-me numa página do teu livro e dá-me um lugar no teu céu.
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